Síndroma D.E.M.

domingo, dezembro 28, 2008

3 Comentários

Prometo não fazer nenhum balanço sobre o ano que agora está dando os últimos suspiros, até porque foi para (quase) todos um ano complicado e bem espremido serão poucas as coisas boas que dele podemos extrair. Apetece-me antes falar de outro assunto, embora não esteja assim tão desligado da situação actual que o mundo atravessa: o surto epidémico de desonestidade que grassa por aí. Aflige-me sobretudo, ou melhor será dizer, deixa-me perplexa, a desonestidade emocional a que muita gente se agarra para conseguir colocar alguém do sexo oposto na posição horizontal (ou vertical, ou de quatro, tanto dá…). Ensaiam encarnar um sentimento que não têm e por não o terem assemelham-se a cópias de qualidade mais do que duvidosa. Fazem-me sempre lembrar o “Joker”, arqui-inimigo do Batman, cujo sorriso forçado de orelha a orelha cheira a falso a léguas de distância. Iguais a um artigo de contrafacção, à primeira vista (e à distância) até parecem genuínos e de início nem dá para acreditar na pechincha caída dos céus aos trambolhões, (o melhor é mesmo não acreditar, porque…) quando se atentar nos pormenores facilmente se verifica que se o levar para casa estará a ser ludibriado e terá dado por mal empregue o dinheiro que gastou na sua compra, pois não tarda nada estão cheios de borbotos ou de forro rasgado ou desbotados com a lavagem. Com certos homens (e suponho que com certas mulheres) o mesmo acontece. O homem atacado pelo vírus da desonestidade emocional luz à distância qual farol da Boa Nova em dia de tempestade e quase nos faz acreditar que a nossa jornada de solitários lobos-do-mar navegando à deriva nesse mar sentimentalmente desértico está prestes a chegar ao fim, acenando-nos com a miragem dum tranquilo porto de abrigo. Inicialmente, temos a tentação de pensar que com um único bilhete de lotaria nos saiu a sorte grande e a terminação, acumuladas ainda com o cabaz de Natal, prémio das rifas compradas na papelaria do bairro. No entanto, lá diz o ditado: nem tudo o que luz é ouro e à escassez do metal precioso, o mais certo é mesmo não o ser. E nada melhor se aplica ao desonesto emocional que esse ditado. Temo bem que nem latão do mais rasca essa espécie possua por baixo da estaladiça camada de brilho ofuscante. Sempre ouvi dizer que quando a esmola é grande, o pobre desconfia. E neste caso é bom que se desconfie mesmo, porque para esse homem não há nada maior do que a sua descomunal ambição em ludibriar sentimentalmente alguém e deve sentir o ego inflado quando pensa que tem a sua vítima na mão (é provavelmente daí que vem a expressão: vir comer à mão...). Para ele não basta assumir-se como ser emocionalmente estéril e viver de acordo com esse principio, do qual muitos de nós não comunga, mas que quando declarado abertamente é tão válido como qualquer outra filosofia de vida. Mas isso não é suficiente. O desonesto emocional colecciona “vítimas” e o seu prazer advém daí. Quase juraria que como um verdadeiro serial killer que se preze, o desonesto emocional tem uma peça de cada uma das suas vítimas guardada dentro duma caixa de sapatos como troféu. Mesmo que a caixa não exista fisicamente, de certeza que a possui enterrada no cérebro e frequentemente a abre para se masturbar no gozo do seu arquitectado embuste. Contudo, à conta da sua frivolidade o desonesto emocional é, felizmente, na maior parte dos casos, facilmente identificável. As suas palavras ocas batem sempre a mesma tecla: o seu enorme “sentimento” por alguém e de como esse “maravilhoso” alguém iluminou a sua “miserável” existência, apesar de se borrifar para coisas tão básicas e para pormenores tão simples como a cor que mais gosta ou a sua comida preferida. A paciência não é o seu forte (o mundo está cheio de potenciais “presas” e por isso há que despachar a actual rapidinho, porque a próxima vítima é sempre a mais apetecida, ou se der para acumular várias ao mesmo tempo, melhor ainda… aí é o verdadeiro Paraíso na Terra!) e num pseudo “relacionamento” com um desonesto sentimental tudo gira à velocidade estonteante da luz, o que leva muita gente a confundir isso com a força incontrolável da paixão, nem desconfiando que tudo já terminou quando pensam que está tão somente a começar. A vida dum desonesto emocional é cheia de hiatos, verdadeiros buracos negros que ocultam a real aridez sentimental, e coberta de inúmeros detalhes cuja “cara nunca bate com a careta”. O desonesto emocional, tão ciente das suas lacunas emocionais, sabe que tem de “dourar a pílula” de forma a parecer ser o que não é. É o primeiro a mostrar-lhe as fotos da mãe, do pai, do cão, do periquito, da casa onde nada falta… excepto, é claro, a mulher ideal, a qual tem vindo a procurar a vida toda, mas… “infelizmente” ainda não encontrou a sua “cara-metade” (eu adoro expressão de cara-metade… vislumbro logo alguém partido ao meio saltitando perneta e desnorteado pela vida fora, à procura da outra metade-pessoa com quem se encaixará em jeito de puzzle para se sentir um ser completo… ai, ai! digam lá se não é tão romântico..???). O desonesto emocional não imagina que existam mulheres que procurem num homem muito mais do que doces palavras, elogios bacocos ou ideais de romance que passam por montagens de puzzle, sejam eles de 2 ou de 1.000 peças. Nem sonha que existam mulheres que não tenham como ideal masculino a encenação patética do Príncipe Encantado da Branca de Neve. A nós, simples mulheres “ralé”, basta apenas estar com atenção aos detalhes e dar ouvidos à nossa intuição quando esta faz tocar os alarmes completamente desaustinada. Com esses pequeníssimos esforços é possível detectar a presença do vírus à distância e evitarmos ser infectadas por ele. Preocupante é mesmo a velocidade que esta epidemia tem vindo a multiplicar-se. A continuar este aumento astronómico de desonestos emocionais masculinos, temo que a OMS se verá forçada a declarar calamidade mundial e iniciar a vacinação massiva da população feminina qual vacina contra o cancro do útero…

Nostalgia de Outono

terça-feira, novembro 04, 2008

3 Comentários

Sinto saudades da Alemanha. Do frio cortante que chicoteia secamente a cara. Saudades do som da neve rangendo fofa ao menor contacto da sola das botas. Do clima gélido e cinzento envolto numa permanente névoa. Saudades da sensação de me sentir em casa. Dos passeios solitários pelo centro de Hannover mesclando-me anonimamente na multidão, sem pressas. Uma cálida nostalgia do pequeno hotel, ancorado no meio de campos agrícolas, de ambiente familiar e decoração Kitsch tão acolhedora. Saudades do enorme quarto que sempre me albergou e da sua confortável cama King Size de cabeceira em leque, forrada a veludo rosa seco e pontilhada de minúsculas luzinhas ambiente de intensidade regulável. Saudades de sentir uma enorme saudade tua. De imaginar-te lá, comigo, adormecido. Deitado na cama de cabeceira chuleada a luzinhas ambiente. Nós dois, debaixo dum aconchegante edredão de penas. Eu, imóvel evitando o mínimo gesto para não te acordar, escutando na penumbra a tua respiração descontraída e sentindo o suave calor que se desprende do teu corpo. Saudades de sentir o dia a nascer opaco de neblina para lá das cortinas blackout e de imaginar-te acordando, como o despertar da claridade, tão devagarinho. Saudades de perceber o nosso silêncio, amnésico de palavras, quando os olhares se tocam num cumplice sonolento sorriso. Saudades da imaginação correr tão fértil e solta, sem o embaraço de ses, nem mas, nem poréns. De sermos só nós, apenas nós, eclipsados por brancos edredões de penas, num pequeno hotel esquecido do resto do mundo no meio de campos gelados de pastagem…


Hotel Perle in Otternhagen bei Hannover
se alguma vez tiverem essa oportunidade, não deixem de se instalar neste pequeno hotel, para além do acolhimento 5 estrelas, a comida é pura e simplesmente deliciosa...
que saudades...! (e a cama com luzinhas na cabeceira existe de facto)

This Song's for You

sábado, outubro 04, 2008

3 Comentários

PARABÉNS!

PORQUE LUTASTE E FIZESTE POR MERECER TUDO DE BOM QUE TE ESTÁ A ACONTECER E EU NÃO TERIA FICADO MAIS FELIZ SE O MESMO ESTIVESSE A ACONTECER COMIGO.

MESMO SABENDO QUE O AMANHÃ É UM PLANETA DISTANTE, TENHO UMA ÚNICA CERTEZA:

INDEPENDENTEMENTE DAS VOLTAS E REVIRAVOLTAS QUE A VIDA DÊ E DOS CAMINHOS QUE CADA UM FIZER QUESTÃO DE TRILHAR, HAVERÁ SEMPRE UM ESPAÇO NA MINHA VIDA, NA MINHA AMIZADE, NO MEU CARINHO, NO MEU AMOR EXCLUSIVAMENTE TEU!

FOR SO... THIS SONG'S FOR YOU, BABE!

"...I KNOW IT'S NOT MUCH BUT IT'S THE BEST I CAN DO, MY GIFT IS MY SONG AND THIS ONE'S FOR YOU"

"I HOPE YOU DON'T MIND THAT I PUT DOWN IN WORDS, HOW WONDERFUL LIFE IS WHILE YOU'RE IN THE WORLD...!"




"Your Song" - Elton John

Have you ever thought about me the way I am?

segunda-feira, setembro 01, 2008

1 Comentários

Estou tão cansada. Esvai-se o ténue fio de energia que ainda me mantém a funcionar em modo automático. Não consigo mais. Só penso em desistir. Há várias semanas não durmo mais de 2 horas seguidas. Cada fibra muscular apresenta um estado preocupante de cansaço. Dói-me o corpo como se tivesse participado na mais desgastante das maratonas. Um cansaço de morte. Tudo vem à memória desordenadamente. Prazos a cumprir e não consigo escrever uma única frase com nexo. Nada na minha vida faz sentido. Não me apetece continuar. Não tenho mais vontade. Esforço-me mas em vão. Não consigo. Vá, vai ser desta que a coisa sai como queres. Vamos lá. Só mais um pouco e chegas lá. Ensaio com os dedos sobre as teclas imitando a concentração inspirada de pianista em início de concerto. É no silêncio que te procuro. Mas que raio estou para aqui a escrever? Não… Na verdade já não te procuro mais. Tão pouco no silêncio. Quebrou-se algo de tão sagrado cá dentro. Nem sei bem o quê. Nem sei bem onde. Algures cá dentro, há algo de diferente. Não consigo discernir com exactidão. Estou exausta. E o livro por acabar. O amor por ti ainda cá mora. Sinto-o. Mas não me parece mais o mesmo. Como se observasse uma estrela pulsando à distância de muitos anos-luz. Sabemos que existe algures. Vemos o seu brilho, mas não nos consegue aquecer. Não entendo. Como se pode continuar a amar alguém e ser-nos indiferente que a morte se cruze connosco a qualquer instante, quando antes, antes só a ideia de não te poder ver mais, de não te sentir, ou de não partilhar contigo o acto mais insignificante da minha vida me deixaria em pânico? Não pela morte em si, mas por significar o nosso definitivo afastamento. Não sei o que se passa comigo. Os primeiros sintomas desta estranha incapacitante doença apareceram durante a viagem de Londres para cá. Imaginei o que sentiria se o avião tivesse uma súbita perda de altitude e estivesse eminente despenhar-se no solo ou no mar. Tenho pavor andar de avião. São sempre viagens tensas, pressurizadas em ataques sérios de ansiedade. Mas, dessa vez… Nada. Era-me indiferente se morresse naquele momento. Nada de que me arrependesse. Nada que me fizesse querer pedir prorrogação de prazo da minha vida. Nem a vontade de te dizer uma última vez eu amo-te. Para quê? Foi palavra que deixou de fazer sentido. Definitivamente algo aconteceu. Algo quebrou aqui. Não sei o quê. Estou diferente.

U2
"who's gonna ride your wild horses"

AS FASES DA LUA - DOIS ANOS DEPOIS...

quarta-feira, agosto 13, 2008

15 Comentários

Hoje é dia de comemoração.
O blogue “As Fases da Lua” foi criado há precisamente 2 anos.
Em vez de dissertar sobre as razões que me levaram a criá-lo, este post é uma homenagem aos leitores deste blogue. Aos que são duma assiduidade tão exacta quanto um relógio suíço. Aos que o lêem de quando em vez. Aos que já leram e deixaram de o fazer. Aos que chegaram recentemente. Aos que ainda não leram e que um dia o virão a ler. Aos interventivos e opinativos com os seus comentários. Aos que o lêem em recato e não expressam o que sentem. Aos que concordam. Aos que discordam. Aos que gostam do que escrevo. Aos que odeiam o que escrevo. A todos, sem excepção.
Mesmo sem leitores haveria sempre “As Fases da Lua”, porque a escrita é um silencioso e doloroso parto solitário com frequente recurso a fórceps. Nessa violenta ensanguentada expulsão, vem sempre um pouco da minha essência por arrasto. Frequentemente em situações e personagens imaginários mais ou menos controversos, por vezes assumidamente em carne e osso. Mas nenhum destes posts estaria vivo se não tivesse sido lido por vós. Foram vocês que, com a vossa leitura, depois de nascimentos muitas vezes atribulados, lhes aplicaram as técnicas de suporte de vida neonatal. Graças aos leitores eles sobrevivem. E continuarão a viver, enquanto houver alguém que faça o favor de os ler…

Porque estou numa fase revivalista, ofereço-vos esta música dos The The - faz-me lembrar umas férias em que acampei nas Caldas das Taipas com dois amigos. Teria eu uns 16-17 anos. Passávamos o tempo todo a ouvir este grupo num volume que, digamos, dava para todo o parque ouvir. Porque na altura uma jovem raramente acampava sozinha com 2 rapazes, e apesar de termos levado duas tendas, eles os dois dormirem juntos e eu ficar sozinha numa delas, todos no parque achavam que eu era sueca e andava enrolada com os dois. Todos sabem a importância das suecas no imaginário libidinoso do homem mediterrânico, mais em concreto no do homem português. Se a isso juntarmos a interioridade que se fazia sentir nas Caldas das Taipas há quase 30 anos atrás, temos o mais completo guião dum filme porno bem hardcore prontinho a ser servido. Portanto, podem já imaginar o que todo o parque imaginava que nós os três andaríamos a fazer pela calada da noite ou do dia, tanto faz, que para as suecas, como toda a gente sabe, é a toda a hora e a todo o instante e com aquele que estiver mais à mão, ou ao pé, tanto dá - e no meu caso, como boa sueca que se preze, até podia reveza-los... Após estes anos todos, só ainda não consegui perceber muito bem como puderam pensar que seria sueca. Deveria ser do meu ar acentuadamente nórdico – uma brasa de 1,60 m de altura, cabelo castanho avelã e olhos castanhos escuros. Eles tinham razão, qualquer um me confundiria com esses “aviões” nórdicos loiros, altos e curvilíneos… no mínimo… digo eu… Ou então seria pelos The The. Nunca ouvidos por aquelas paragens muito menos em tão altíssimos decibéis.

The The
Uncertain Smile

I'm So Sorry...

domingo, agosto 10, 2008

3 Comentários

Fixo os seus tímidos olhos travessos, tão escuros como dois imensos buracos negros, quase infantis na inocência do brilho emocionado que irradiam. Sensibiliza-me que se comova por mim, espanta-me até, por não ter previsto que o pudesse tocar dessa forma tão avassaladora, tão despojada. Eu, que nunca me achei capaz de nada de muito relevante, muito menos ser alma inspiradora de tão grande sentimento, incapaz de ficar contido em exíguo espaço corporal e que transborda o seu recipiente humano numa torrente de reveladoras lágrimas silenciosas. Culpabilizo-me por ter subestimado o seu enorme afecto. Culpabilizo-me por não corresponder, nem sequer no mais levíssimo grau de emoção. Culpabilizo-me de o ver assim exposto numa nudez sentimental embaraçosa. Quero dizer-lhe que esconda a alma, resguarde-a de mim, feche-a em local seguro e inviolável, porque não sou de confiança, não sei ter à minha guarda tamanho tesouro sem lhe causar danos irreparáveis. Sou a maior contra-indicação para o seu estado. O pior dos efeitos secundários de consequências imprevisíveis. Mas não sou capaz. Não me iria acreditar. Não me vê como sou. Como estou agora, sem nada de bom para lhe oferecer. Apesar de me sensibilizar toda essa comoção não me toca. Não me prende. Para lá da culpa, não me diz nada. Uma gélida assintomática culpa. Reconheço que ele merece muito mais do que esta glacial sensibilidade racional. Pelo menos, uma outra torrente incontida, em tudo idêntica à sua. Mas nada. Nem o mais pequeno sopro de vida deste lado. Lamento tanto, mas não sinto nada.

The Smiths
I'm So Sorry

Amanhã, Logo se Vê

quinta-feira, julho 31, 2008

4 Comentários

O mundo parou aqui dentro. Nada move. Devo ter deixado de respirar. Nem mesmo tu conseguirias hoje o milagre de me ver renascer. Hoje não quero ninguém. Não reconheço ninguém. Não sei de ninguém. Não salvo ninguém. Não quero ser salva. Deixem-me aqui no meu canto do mundo parado. Estático. Apodrecendo devagarinho. Prometo não feder na minha podridão. Não vos incomodo. Não quero ser incomodada. Cansei de me reinventar uma e outra e ainda uma outra vez e nascer sempre a mesma. Pior do que isso. Renascer em adulteradas cópias de péssima qualidade de mim mesma. Por isso, só por hoje deixem-me morrer em paz (amanhã, logo se vê). Desapegada de tudo. Não odiando ninguém e, principalmente, não amando ninguém. É verdade. Esse dia haveria de chegar. Hoje nem a ti te quero por perto. Não te sinto cá dentro. Obriguei-te a desencarnar de mim. Não te levo comigo. Qual mágico decrépito, já não consigo tirar da cartola coelhos presos pelas orelhas e no entanto, estou perfeitamente nas tintas para os assobios voyeuristas da plateia. Viro-te as costas. Encolho os ombros. Não quero saber. Não me importa. Só quero morrer em paz. Não anunciem a minha morte. Ninguém notará a minha ausência (nem tu darás pela partida nem sentirás a minha falta - não quero que sintas a minha falta!). Também ninguém dirá: era tão boa pessoa. Porque todos os mortos ficam boas pessoas e eu não quero morrer e virar boa pessoa. Nem má pessoa. Não quero ser nada. Nem tão pouco que me lembrem. Não quero lágrimas, nem adeus desesperados. Esqueçam-se de mim. Tal como hoje, me esqueci de vós.

Ne me Quitte Pas

domingo, julho 20, 2008

5 Comentários

Sempre achei a canção mais bonita que algum homem poderia dedicar à mulher que ama, talvez pelo desespero do pedido "não me deixes", porque só um homem apaixonado pede à mulher que ama que não o deixe, porque tudo pode ser esquecido, mesmo o tempo dos mal-entendidos. Talvez porque, apenas um homem indefeso na sua paixão promete à mulher que ama edificar um reino onde o amor será rei, onde o amor será lei e ela, apenas ela, a sua rainha. Talvez por saber que só um homem que ama sem defesas, admite não querer chorar mais, nem falar mais, porque tudo o que quer é poder observá-la e vê-la sorrir. Por ser tão dificil a um homem admitir a sua fragilidade no amor, ter existido um poeta/cantor que tão sensivelmente soube transmitir em palavras e música essa nudez de alma torna esta canção, a meu ver, ainda mais bela:

"Ne me quitte pas
Il faut oublier
Tout peut s'oublier
Qui s'enfuit deja
Oublier le temps
Des malentendus
Et le temps perdu
A savoir comment
Oublier ces heures
Qui tuaient parfois
A coups de pourquoi
Le coeur du bonheur
Ne me quitte pas (4 fois)

Moi je t'offrirai
Des perles de pluie
Venues de pays
Où il ne pleut pas
Je creuserai la terre
Jusqu'apres ma mort
Pour couvrir ton corps
D'or et de lumière
Je ferai un domaine
Où l'amour sera roi
Où l'amour sera loi
Où tu seras reine
Ne me quitte pas (4 fois)

Ne me quitte pas
Je t'inventerai
Des mots insensés
Que tu comprendras
Je te parlerai
De ces amants là
Qui ont vu deux fois
Leurs coeurs s'embraser
Je te racont'rai
L'histoire de ce roi
Mort de n'avoir pas
Pu te rencontrer
Ne me quitte pas (4 fois)

On a vu souvent
Rejaillir le feu
De l'ancien volcan
Qu'on croyait trop vieux
Il est paraît-il
Des terres brûlées
Donnant plus de blé
Qu'un meilleur avril
Et quand vient le soir
Pour qu'un ciel flamboie
Le rouge et le noir
Ne s'épousent-ils pas
Ne me quitte pas (4 fois)

Ne me quitte pas
Je ne vais plus pleurer
Je ne vais plus parler
Je me cacherai là
À te regarder
Danser et sourire
Et à t'écouter
Chanter et puis rire
Laisse-moi devenir
L'ombre de ton ombre
L'ombre de ta main
L'ombre de ton chien
Ne me quitte pas (4 fois)"

Jacques Brel


Did You Love Me?

quinta-feira, julho 17, 2008

5 Comentários

- Amei-te tanto...!
- Pois...
- A sério. Amei-te mais do que tudo. Acima das minhas forças.
- Hã, hã…
- Por ti teria sido capaz de tudo…! Algo de grande, entendes?
- Certo… Tens alguma coisa que se coma?
- O quê…?
- Comida… morfes…aquilo que habitualmente se mete à boca, mastiga-se e engole-se…
- Hã… sim. Claro. Abre esse armário. Deve haver por aí umas bolachas. Se quiseres queijo ou fiambre, estão no frigorífico. Onde eu ia? Ah, pois… é verdade, o que senti por ti bateu forte… muito forte, mesmo. Pensei, por várias vezes, que o meu peito explodisse de tanto sentimento.
- Só tens mesmo isto para me oferecer?
- Diz…?
- Se só tens estas bolachas mirradas para acompanhar com o queijo?
- Não… acho que não. Devo ter pão…
- Pão???? Estás louca??? Eu sou lá homem de comer sandes de queijo???
- Tostas, pode ser?
- À falta de melhor… ok, venham lá as tostas!
- Como te estava a dizer… sabes, acho que nunca amei ninguém como a ti… até fico meio envergonhada de confessar isto… pareço uma adolescente a falar do 1º amor!
- Hã, hã… o queijo até que não é mau… estaria melhor se não o tivesses deixado secar…
- Ah, desculpa… Raramente como queijo… mas… confesso que cheguei a pensar que tu e eu… nós os dois… as coisas pudessem funcionar… da minha parte gostaria muito que tivessem funcionado…
- Brie…
- Desculpa…? Disseste alguma coisa…?
- Queijo Brie… Da próxima vez compra queijo Brie… é muito melhor que esta sola de sapato que aqui tens!
- Ah… ok. Vou tentar não esquecer… queijo Brie… ao certo nem percebi ainda porque não terá funcionado… acho até que nós os dois faríamos um casal perfeito… tu o que achas?
- Humm, humm… mas só se recheasses melhor a despensa, minha cara. O ditado é muito antigo, mas verdadeiro: homens conquistam-se pelo estômago…!

Encontros Imediatos - Parte IV

domingo, junho 01, 2008

2 Comentários

- Vieste o caminho todo tão silenciosa! Sentes-te melhor?
- Sim, amor. Obrigada por perguntares.
- Pareces também mais tranquila. Estás a ver, fez-te bem irmos beber um copo com o Barros e a Isabel!
- Achas?
- Sim, estás com outro ar! Mais sereno, talvez.
- É provável. Ter bebido um pouco também ajudou. Acabei por relaxar. Aquele bar é simpático. Tranquilo. Boa música. De que falaram vocês?
- Quem?
- Tu e a noiva do Barros…
- Nós…?
- Sim, querido. Enquanto fui à casa de banho. Quando cheguei estavam só vocês os dois na mesa. O Barros deve também ter ido à casa de banho, entretanto… De que falaram vocês?
- Ah… nada de importante! Banalidades! O costume! Onde nasceu, onde mora, como conheceu o Barros, esse género de coisas…
- E…?
- E o quê?
- Onde nasceu...? Onde mora…? Como o conheceu…?
- Ah…! Parece-me que disse ser de Portalegre, ou de perto, não sei bem. Mora aqui no Porto, disse-me o local mas não fixei bem. Sabes como sou com nomes de ruas, para mim são todas iguais… Creio que morou alguns anos em Lisboa antes de vir para cá. Conheceu-o no Egipto, mas isso já tu sabes, estavam instalados no mesmo hotel, fizeram as mesmas excursões, etc, etc, etc, e acabaram juntos, voilá!
- Bom, vou deitar-me. Estou a cair de sono, amor.
- Sim, vai. Eu também já vou. Estou só acabar este whisky e já me deito também.
- Não demores então!
- Não, não me demoro!

Que interrogatório…chiça! Terá desconfiado de alguma coisa…? Não! Claro que não! Se desconfiasse teria feito uma peixarada de todo o tamanho! A Laura não é mulher de deixar passar deslizes em branco. Mas não fomos apanhados por uma unha negra! Deus do Céu! Aquela Isabel é louca! Ainda sinto a língua dela a escaldar no meu ouvido avançando por aí fora como se não houvesse amanhã… fico todo arrepiado só de me lembrar! E ali, em pleno bar… A Laura enfiada mais uma vez na casa de banho, provavelmente com outro achaque - o raio da mulher agora dá-lhe para isto, são chiliques atrás de chiliques – então se me encosto a ela à espera que me caia alguma coisa em sorte, vem-me logo com o mesmo de sempre, querido hoje não, que me dói a cabeça… muita dor de cabeça tem ela! À outra, à Isabel, bastou o Barros ausentar-se da mesa que a menina não foi de rodeios… viu, quis, pegou! Ainda bem que nem a Laura nem o Barros se aperceberam nada! Havia de ser cá um 31... Nem estou ainda bem em mim! Fiquei sem reacção… nem quis acreditar quando senti uma mão a insinuar-se pelo meio das coxas até ao… até aí mesmo! Sem mais delongas! Alguém ficou bem mais longo ali mesmo isso é certo! Parece que ainda tenho o recheio daquele decote pressionando-se contra o meu braço. E o perfume dela..? É de enlouquecer qualquer um! De certeza, devo ter sonhado e ainda não acordei! Onde será que meti o bilhete com o nº. de telemóvel dela? Tenho de o gravar no meu telemóvel e destruir o papel antes que a Laura o apanhe por aí à solta…

O Sonho

domingo, maio 04, 2008

2 Comentários

Hoje sonhei contigo. Sonho rápido, fugaz. Encapsulado em esconsos e dúbios sentidos urdidos no silêncio da madrugada pelo inconsciente, que se diverte a lançá-los à consciência como ratoeiras de queijo à espera da gula e soberba da sua vítima incauta, gozando sadicamente por antecipação com a imagem desta, mortalmente debatendo-se de miolos esmagados contra a realidade. Metáforas sonhadas, escondendo aqui, destapando ali os escuros bafientos túneis secretos da existência, deturpados no dia-a-dia pelo consciente que os molda e os contorna com medos, ânsias e vontades, tornando-os menos dolorosos menos assustadores. Lembro-me de viajar num autocarro, sentada num banco de um único lugar, daqueles solitários bancos dianteiros em frente a um outro solitário banco dianteiro. Do lado direito, de costas para a paisagem e para o movimento. Cabeça quase colada ao vidro, olhando sem ver o infinito através deste. Ninguém sentado à minha frente. Sem destino traçado. Deixando-me ir pelo movimento. O anónimo motorista fazendo o percurso desconhecido parando e arrancando em sítios incógnitos que só ele parecia saber. Não me parecia importar. O autocarro quase vazio tirando umas 5 ou 6 pessoas dispersas, sentadas ao acaso. Ninguém parecia importar-se. Ou talvez já conhecessem o caminho que eu desconhecia. Não me lembro de nenhum pormenor da paisagem mas pairava no ar a sensação de um dia ameno de final verão. Eu, sozinha. Sentada no banco solitário de costas voltadas ao percurso, não vendo casas, campos, ruas, pessoas, animais que, obedecendo à vontade insondada do anónimo motorista, com maior ou menor velocidade, corriam a afastar-se da janela onde eu, distraída, olhava sem ver o infinito. Não me apercebi da tua presença. Dei por ti apenas no momento em que te dirigiste para a porta e carregaste no botão accionando o sinal luminoso de saída. Acompanhava-te uma mulher de ar muito jovem. Olhos de um azul intenso. Pele sedosamente clara. Cabelos negros curtos, acima dos ombros. Rosto irradiando a felicidade que se tem quando se é demasiadamente jovem e se acredita que o mundo é inocentemente nosso. Qualquer um naquele autocarro poderia tomá-la por tua filha. Menos eu. Não era tua filha. Tu, atrás dela. Não falamos. Nenhum fez menção de dizer algo. Nada. Apenas o nosso olhar se cruzou e hipnoticamente se enganchou, para não mais se afastar. A tua mão direita pousada sobre o ombro da mulher jovem, parecia querer protegê-la de qualquer desequilíbrio provocado pelo movimento irregular, embora estivesse apenas pousada. A tua mão esquerda entrançada na alça de segurança por cima das vossas cabeças. Tu, atrás da mulher jovem. O autocarro obedeceu algumas centenas de metros à frente ao teu pedido de paragem. A porta abriu-se. A mulher jovem desceu. Desceste atrás. Não sem antes o nosso olhar cruzado teimar em não deslaçar e eu receber uma profunda tristeza vinda dos teus olhos escuros. A mesma tristeza de quem parte sem regresso. A tristeza de quem optou, sem saber se escolheu o melhor. A tristeza de quem não voltará atrás. Mesmo que o sentimento ou a vontade ou ambos o peçam. Breves fracções de segundo gravadas eternamente em tempo fugaz de sonho. Apearam-se numa rua de passeio estreito, demasiado estreito até, de casa velha a servir de murado amparo para quem descesse aí. Lembro-me que as janelas da casa estavam situadas apenas no 1º andar. Provavelmente para que ninguém pudesse ver o que as paredes guardavam. Não dissemos palavra. Ninguém soube que comunicamos sem palavras e que dissemos tudo. Eu soube quem era a mulher jovem. Tu soubeste que eu soube. Saímos um do outro. Despedimo-nos. Ambos soubemos que nos estávamos a deixar. Não fiz qualquer tenção em te segurar, apesar do vazio imenso que ficou depois da tristeza recebida dos teus olhos. Apesar das minhas mãos caídas sobre o regaço. Também elas vazias. Eu, continuando viagem num autocarro de linha periférica serpenteando por ruas apertadas de empedrado rugoso sem destino traçado. Tu, apeado numa rua qualquer de passeio estreito para duas pessoas, de mulher mais jovem pelo braço, abandonando de livre escolha o meu autocarro de percurso desconhecido e irregular. Demasiadas incertezas para quem tanto carece de segurança. Os dois em equilíbrio periclitante no passeio estreito. Despedimo-nos sem um único som. Sem nada. Apenas com um cruzar de olhares por testemunha. Necessitei dum autocarro em andamento num qualquer sonho mesclado para suportar a realidade. O homem que amo preferiu o amor de outra mulher. Idade para ser sua filha. Mas que não é sua filha.

O Meu Coração É Dele

sábado, abril 19, 2008

4 Comentários

- Mãe, desculpa ter-me zangado contigo hoje de manhã – foram as primeiras palavras do meu filho quando chegamos a casa ao final da tarde, depois de o ter ido buscar à escola. Foi de facto uma zanga feia. Logo pela manhã, de tempo contado à milésima de segundo e exasperada por ele não se despachar e ainda por cima a vociferar impropérios a torto a direito como se a culpa do atraso fosse de toda a gente menos dele, acabei por descarregar nele a minha impaciência e de lhe dizer umas palavras bastante duras, embora justificadas, mais duras do que é meu hábito com ele. É claro que ambos estávamos já arrependidíssimos minutos depois, mas teimosos como somos, nenhum quis dar o braço a torcer. Despedimo-nos um do outro de cara amarrada. Ele para uma visita de estudo a uma oficina de joalharia, eu para mais um dia de trabalho.
- Sabes, pensei que seria melhor fazer as pazes contigo, por isso durante a visita de estudo pedi a um senhor que me fizesse isto para ti. – abriu a mão e nela estava uma pequena peça em forma de coração feito de chapa acobreada com o meu nome gravado em letras maiúsculas: MARIA e uma pedra brilhante incrustada no topo do I. O meu filho é muito tímido. Odeia ter que falar com pessoas estranhas, por isso sei bem o sacrifício que foi para ele ter que se dirigir a alguém que não conhecia e pedir que lhe desenhasse um coração com o meu nome.
Desnecessário será dizer que fiquei comovidíssima e sem palavras por ter recebido um dos presentes mais valiosos que alguém me deu até hoje, apenas comparável com os pequenos pedaços de vidro verde garrafa que anos atrás – talvez uns 4 ou 5 - ele apanhou no recreio da escola e me deu, dizendo serem pedras preciosas (até hoje ainda as tenho guardadas numa caixinha), ou com a dedicatória que escreveu em fita adesiva cor creme e colou na porta do meu guarda-fatos, o ano passado: “A minha Mãe pode ser tudo o que puder e quiser. Ninguém pode imaginar o que ela pode conquistar. Nunca desistas Mãe!”
Hoje, é o seu aniversário. Ele faz 12 anos. A minha vida teria sido muito diferente se ele não tivesse nascido. Teria tido oportunidade de investir noutras áreas que, com o seu nascimento, tive de abdicar. Talvez tivesse mais estabilidade financeira. Talvez tivesse voltado a estudar e tirado um 2º curso, aquele que sempre quis. Talvez tivesse uma carreira profissional mais segura. Contudo, no meio de tantos “talvez” tenho uma certeza inabalável: nunca, mas nunca me arrependi da decisão que tomei. A minha vida é muitíssimo mais rica apenas por ele existir e é um imenso privilégio assistir à sua transformação diária num ser humano maravilhoso.

FELIZ ANIVERSÁRIO MEU QUERIDO!

(esta música é-lhe dedicada)


(...e esta foi ele que escolheu)

Sempre...

domingo, março 30, 2008

3 Comentários

E volto a ti. Volto sempre a ti. Como um casaco já gasto, puído pelo tempo, onde frequentemente abandono trocos esquecidos nos bolsos já alargados pelo uso, mas que teimo em não deitar fora, voltando a vesti-lo, uma vez e outra e outra e de cada vez juro ser a última e que é desta que vai mesmo para o lixo porque o corte já não me assenta já não se usa, mas com o qual me sinto inusitadamente confortável e me aconchega melhor que outros mais actuais, mesmo sabendo já não possuir a magia da peça de roupa por estrear, virginalmente embrulhada no murmúrio branco delicado do finíssimo papel vegetal ainda ostentando ao peito as várias etiquetas como medalhas de mérito, acabadinha de sair da loja, vaidosamente envolta no glamour da novidade. Porque destila incontornáveis lembranças ao simples cheiro da alfazema, que se desprende do gasto entrelaçado em teia e trama de tecido, acumulado ao longo de silenciosas temporadas aguardando estoicamente dentro do guarda-fatos a esperada devolução à liberdade do seu prolongado cativeiro, como em criança o almiscarado odor a terra quente, molhada pela repentina chuva tempestuosa de verão me extasiava os sentidos. E porque moldou-se ao feitio do meu corpo. Da minha essência. O disforme tecido bamboleado não é mais do que a sua perfeita modulação às minhas inconfessas subconscientes imperfeições. Por isso volto a ti. Voltarei sempre a ti, nesta perversa simbiose de equilíbrio instável entre o deve e o haver libido-afectivo que buscamos pacificar um no outro, tão despudoradamente irracional. Volto a ti, ainda que, por vezes, apenas em memórias que se acumulam na garganta em forma dum doloroso soluço escondido, incapazes de diluir-se lentamente no insidioso passar das horas, dos dias, dos meses. Volto a ti, ainda que em sussurro segredo apenas confessado na profunda volatilidade dum sonho. Apesar da insensatez, volto a ti. Mesmo sabendo-te imperfeito. Mesmo sabendo-te viciadamente imperfeito. Porque sabendo-me perversamente perfeita para a tua imperfeição. Volto sempre a ti. Voltarei sempre a ti. Sempre…

Encontros Imediatos - Parte III

sábado, março 15, 2008

3 Comentários

- Até que enfim, querida? Aconteceu alguma coisa?
- Nada amor. O que poderia ter acontecido?
- Não sei. Demoraste tanto tempo… Já tive de pedir ao empregado para segurar o nosso pedido, caso contrário iríamos comer tudo frio
- Não, não se passou nada. Apenas muito calor aqui. Estive a refrescar-me e retocar a maquilhagem. Só isso.
- Não conhecias o Barros, pois não?
- Eu? Nunca o tinha visto na minha vida! De onde o conheces?
- Oh Laura, estás em pré-menopausa ou quê? Tens ataques de calor, vais para a casa de banho, demoras uma eternidade e agora não te lembras da conversa de há minutos?
- Amor, deve ter sido uma queda de tensão súbita. Senti-me mal. Não tenho culpa que não me lembre da vossa conversa… escusas de falar comigo dessa forma…
- Ok, querida, desculpa. Não fiques assim. Exagerei, desculpa-me… Ele foi meu colega na faculdade. Éramos muito amigos. Na altura, devo ter-te falado dele, de certeza.
- Talvez, não me recordo. Como se chama? Barros? É… é provável… E ela? Quem é?
- A noiva! Conheceu-a numa viagem ao Egipto. Pelos vistos o ar do deserto despertou-lhes a paixão!
- Que pena não ter sido mordida por um escorpião…
- Disseste alguma coisa querida? Não percebi.
- Não, nada de importante, amor… Este ar quente deixa-me exausta! Disse apenas que está um ar pesado de trovão!
- E que tal convidá-los para tomarmos um copo depois do jantar? Seria diferente. Que achas?
- De certeza que eles não devem querer, amor! Querem estar sozinhos!
- Qual quê! Têm muito tempo para isso, também não vamos estar com eles a noite toda! Apenas um copo! Vá lá!
- Não sei querido, talvez não seja boa ideia…
- Que nada! Bebemos um copo, conversamos, vá lá! Divertirmo-nos um pouco…!
- Só um então. Estou mortinha por chegar a casa e deitar-me, amor.
- Prometo. Vou lá perguntar-lhes, ok?

E agora, menina? Boa enrascada tu te meteste! Não só vais ter que o olhar nos olhos, como ainda, entre 2 goladas sôfregas na cola light, fazer conversa de circunstância, “Ah sim? Gostou das pirâmides? Dizem que as praias do Egipto são fabulosas…”, quando poucas horas antes te enrolavas nele sem dó nem piedade qual polvo no cio cravejando-o de tentáculos! Valham-me todos os santos protectores…! (grande heresia da tua parte agora evocares a protecção dos santinhos, esses sim iam corar de vergonha e emudecer de choque se tivessem assistido ainda que apenas ao início dos preliminares!). Mas porque raio fui eu responder à mensagem via bluetooth dum desconhecido? Sei lá! Pareceu-me divertido, excitante e completamente inconsequente… que mal fazia? quem não gosta de receber mensagens “linda! dava tudo para ser o teu vestido… essa cor excita-me!”? vá, confessem… quem? Na minha vidinha de sempre, com a lista de compras à frente e um carrinho de supermercado atravancado de mercearia do dia-a-dia, dividida entre o feijão branco manteiga e a atraente promoção do feijão preto brasileiro, com um homem a querer devorar-me como prato principal sem ter que lhe fazer o jantar primeiro, qual a mulher que não iria sucumbir à vaga de calor que me trepou dos pés à cabeça em tempo de fazer inveja ao mais curto record mundial de aceleração dos 0 aos 100 km? Vá, confessem! Fácil é julgar, difícil é resistir, digam lá se não é! Então depois que ele se apresentou, pior ainda! Exemplar encarnação de deus grego! Alto, moreno, defumando feromonas por cada poro da pele subtilmente bronzeada, equilíbrio rigoroso de massa muscular! (... e que massa, Deus Meu!) Pensei, tinha-me saído a sorte grande, a terminação e todos os prémios juntos em pleno corredor das leguminosas e dos farináceos! Só que nada disto me salva agora deste embaraço!!! O que é que eu faço? O Orlando já não vai mais na desculpa do calor… e eles parecem ter aceite o convite…! Ai Meu Deus o que é que eu faço agora?

O Segredo

segunda-feira, fevereiro 11, 2008

3 Comentários

De costas horizontalmente prensadas à alvura do longo papel que cobre a marquesa. O frio metálico dos apoios morde-me desconfortavelmente a barriga das pernas. As coxas escancaradas em despudor clínico colocam-me numa vulnerabilidade ridícula. Sinto a baforada quente do clarão de luz incidido no epicentro do meu baixo-ventre. Respire fundo e relaxe. Obedeço prontamente num assentimento de criança bem comportada. Consigo ver a mini teia desafiando as leis da gravidade ao canto do tecto. Para onde terá ido a aranha. Terá migrado para outras paragens incomodada pelo ambiente antiséptico do consultório, com toda a certeza. De novo o frio metálico agora dentro de mim em forma de penetração médica, numa expedição científica em busca de causas perceptíveis e palpáveis. Tão desconfortável. Mais do que uma impressão. Menos do que uma dor. Apenas um enorme desconforto exponenciado pela sensação de me sentir indefesa. A mão impassível que investiga à procura de respostas. E um súbito calafrio subindo vértebra a vértebra até à nuca atirando-me estupradamente para reminiscências da infância secretamente guardadas. Vem cá, não tenhas medo. Não te vou fazer mal. Vês, quem é amigo, quem é, que até te trouxe um chocolate. Já sabes, só tens de ser boa menina para merecê-lo e deixar-me tocar-te aí em baixo por dentro da tua roupa como no outro dia. Pousa lá a boneca e vem cá sentar-te no meu colo. Isso. Linda menina. Vá, não digas que dói. Tu gostas. Sabes bem que sim. Estás a ver como é bom. Não podes contar a ninguém que eu te faço isto. Este é o nosso segredo… Penso estar tudo normal. Não me parece haver algum problema fisiológico que a impeça de engravidar. Vou prescrever alguns exames de rotina, apenas para ficar mais descansada e comprovar que tudo está em ordem. O facto de ainda não ter engravidado deve-se, muito provavelmente, a factores psicológicos. Ansiedade ou stress são as causas mais prováveis. Tente não colocar tanta pressão sobre si própria e de certeza que conseguirá.

É a Vida...!

terça-feira, janeiro 22, 2008

3 Comentários

Nunca me tinha despedido de alguém, para quem a morte chegará muito em breve. Não sei lidar com a perda das pessoas que me são queridas, quer seja pela sua morte, quer seja pelo seu afastamento voluntário ou involuntário. Nunca soube. Acho que eu própria vou morrer sem nunca aprender. Muitas vezes passo por insensível, por me afastar delas nesses momentos. Não me despedi da minha avó, nem do meu avô, nem da minha tia, nem tão pouco do meu pai adoptivo antes de falecerem. Os que morreram lúcidos, partiram a achar que eu não me importava com eles. Não é verdade. Apenas não sabia dizer-lhes o quanto iria sentir a sua falta sem irromper em lágrimas e soluços. Eles precisavam de apoio e de estabilidade que lhes garantisse uma despedida tranquila da vida. E por sentir que necessitavam de tudo, menos de alguém a soluçar, banhada em lágrimas, baba e ranho, preferi que partissem a pensar que era uma ingrata a ter que perturbar os seus últimos dias com os meus pavores e inseguranças.
Apesar disso, sábado passado enchi o peito de uma trémula coragem e fui despedir-me da minha mãe adoptiva. Depois do AVC pouco restou da mulher forte, determinada que era. Foi sempre uma mulher lindíssima, destabilizadora dos padrões de beleza mediterrânicos - olhos de um azul imenso, pele clara e estatura alta - aos quais a idade acrescentou uma aura de beleza eterna envolta em delicadas rugas e cabelos brancos. As suas feições continuam iguais, embora o seu olhar se perca no rosto dos visitantes sem achar similaridade com alguma lembrança por ventura deixada esquecida no mais remoto recanto da sua apagada memória. A cada minuto que passa, o fino fio que a prende à vida vai-se tornando cada vez mais frágil. Não creio que me tenha reconhecido. Melhor assim. Já foi difícil conter as lágrimas. Se ela estivesse consciente da sua situação terminal e de quem eu era, ser-me-ia incomportável.
Tinha 1 mês de idade quando ela e o marido, falecido há já vários anos, decidiram adoptar-me aos seus cuidados, enquanto os meus pais se ausentavam para o trabalho. Foi uma adopção de coração onde era tratada como a filha mais nova. Fui sempre considerada da família por todos, desde os familiares emigrados em França, que em Agosto traziam a um Portugal ainda adormecido na ditadura as últimas novidades do mundo moderno, até ao futuro genro que anos mais tarde se casou com a única filha deles e a quem eu, pirralha de palmo e meio, encobria o namoro de qualquer interrogatório que me fosse feito pelo progenitor. Passei mais tempo com eles, durante a minha infância, do que com os meus pais. Para onde eles fossem eu ia também, desde a simples visita ao cemitério para enfeitar as campas de flores e velar os seus mortos, até às idas para Esmoriz nas férias de Verão, onde corria na praia atrás de caranguejos e atabalhoadamente ajudava as varinas na recolha das redes de pesca.
Neste momento da minha vida, em que se somam as perdas físicas às perdas afectivas e às perdas materiais, questiono-me se haverá realmente algum propósito nessa dor que me deixa órfã daqueles que mais amo. Que crescimento interior poderá nascer de tamanha dor desproporcional? Suponho, apenas algo muito sofrido e sombrio que eficazmente disfarçarei através meu habitual e irónico humor negro. Apenas alguns, muito poucos, saberão notar que o brilho do olhar reflectirá uma luz turvada, diferente do normal. Porque um pouco de mim já partiu com ela...

Como tantas vezes ela dizia:
É a vida...!

African Sun

segunda-feira, janeiro 14, 2008

1 Comentários

Tarde tão tranquila. So relaxing I must say. Óptima companhia, lugar esplêndido para conversar, procurar some bargains londrinas, visitar livrarias. Simplesmente ir. No big rush, just stroll around. Deixar as palavras fluir tranquilamente com a brisa calma e solarenga de Outono. Quite unexpected for British weather, isn’t it? A serenidade que emana deste companheiro acidental de jornada sem destino pela cidade é uma autêntica bênção para os meus sentidos. Um perfeito hino à beleza masculina compactada em fortes e altos genes germânicos e exportada alguns anos atrás para o extremo sul do continente africano. I’m so glad you could come along with me. Também eu Jorg, também eu. Well, don’t get me wrong. You surely have such an amazing piece of ass, mas fico mais confortável não ter que fazer contigo o habitual jogo da sedução all the way through, you know? que uma situação destas usualmente imporia. Entendes, sabe-me bem inocentemente flirtar contigo desta forma inconsequente, apreciando a tua companhia e atenção inesperadas. Entrar nos teus olhos verde esperança e vê-los colorir dum brilho especial quando falas de África do Sul now, I could never go back to Germany again e das lindíssimas praias de areal a perder de vista pela extensa costa marítima africana, you should go and see for yourself enquanto distraidamente furas vagas de gente apátrida que varrem apressadamente os passeios londrinos em sentido contrário. To help you browsing in a bookshop for that book you’ve always wanted to read. E conseguir encontrá-lo tão facilmente como se, neste tempo todo, aguardasse apenas que os dedos das minhas mãos o revelassem ao mundo. You are my lucky charm. I’m so happy you found this book for me, that I could hug you right now. To feel you so pretty close at this point that I could almost hug you back Jorg. Sentar serenamente num coffee shop e deliciarmo-nos com a pequena extravagância dum cappuccino e dum lemon and orange muffin e ouvir-te dizer com o mesmo olhar verde de há pouco onde mulher alguma se importaria de se afogar I have a really wonderful family. I just love my wife and children. Mais uma vez, don’t get me wrong Jorg. Não me estou a atirar a ti, se exceptuarmos este lânguido flirtar que me conforta a alma, confesso, só de saber que se houvesse enough drive from both of us, estaríamos ambos in the right mood to... É por saber que existe na vida real, não ficcionada em livro, filme ou outro enredo qualquer dependente da insana vontade de escritor ou argumentista, such an amazing family, a qual faz um homem, apenas um que seja, dizê-lo de tal forma sentida irradiando felicidade por todos os poros, que me inunda repentinamente os olhos num marejar de lágrimas mal disfarçadas. Porque esse happily ever after sempre me foi negado. Nunca o senti. Nunca foi meu. Babe, make no mistake não uma família qualquer que se atura no pão nosso de cada dia, que se odeia raivosamente em silêncio entre uma garfada de puré aquecido no microondas e outra de fatia recessa de lombo sobrada do almoço de Domingo, que se martiriza sadicamente em jogos maquiavélicos de poder e submissão esperando tirar dividendos quando todos saem a perder. É a família para quem se aguarda ansiosamente a cada segundo voltar. A família que nos sossega todos os medos só de pensarmos o quão felizes somos de a termos. A família que tu tens Jorg. Essa família que me foi negada, que eu nunca tive. E é essa família que me faz querer subitamente beijar os teus lábios Jorg, esperando que me passes através deles essa happily fulfilled family sensação, como sopro de vida que se agarra aos meus e me resgata deste desértico purgatório de amor não suficiente, de amor sofrido, de amor cansado. Que me possa transportar ainda que por breves momentos até África e me aquecer no sol quente de Durban, numa casa grávida de luz e de risos felizes de crianças, onde flutua ainda no ar o odor fresco a sémen. Breves instantes apenas. Afinal seria tão fácil, Jorg to kiss your awesome lips... deixar-me levar I really enjoyed spending this afternoon with you pelo fino fio de esperança you were such a wonderful company preso a esses olhos verdes...

Portugal à Distancia

quinta-feira, janeiro 10, 2008

4 Comentários

Heimtextil Messe - Frankfurt
10.01.2008

Pavilhoes a fervilhar de gente. Cores, cores e mais cores. Este ano tudo me parece igual. Desde o homem de bigode, baixinho e gordo que aguarda pacientemente a vinda dos clientes, até aos produtos expostos. Nada se destaca. Nem um único artigo que ainda nao tenha sido visto, nenhuma tonalidade que ainda nao tenha sido experimentada. Ninguém quer arriscar. Sinais da crise que assola um pouco por todo o lado. Até os indianos e os chineses estao comedidos este ano. Longe vao os tempos das compras de artigos por impulso momentaneo.
Aproveito uma pausa para ver e-mails (a internet é disponibilizada gratuitamente aos visitantes da feira - estou de facto numa outra galáxia). Ainda sobra algum tempo. Actualizo a leitura dos blogues que mais gosto. Fico a saber que Arya (http://arya-journal3.blogspot.com) decidiu, infelizmente, encerrar o seu blogue. É um dos meus favoritos. Vou sentir falta! A Yashmeen (http://entredoismundos.wordpress.com/2008/01/08/esclarecimento) anda às voltas com a tacanhez portuguesa (pela minha parte confesso, nao fosse pelo meu filho e arranjaria forma de nao regressar a Portugal no proximo sabado e nao quero saber que me chamem apátrida). O blogue Abrotea (http://abrotea.blogspot.com), da Patrícia, é o seguinte. Grande murro no estomago com direito a "knock-down" e tudo (se o meu filho estivesse aqui já me tinha explicado direitinho que hoje nao se diz "knock-down", mas sim "smack-down" - coisas do wrestling!). O seu último post é tudo quanto desejava expressar e ainda nao tinha tido tempo de digerir para colocar em palavras. É duma beleza, simplicidade e clareza indiscritível. Nada fica por dizer. Está tudo lá. É a alma exposta até à essencia sem a proteccao dum único fino véu. Há textos que tem esta particularidade, de nos abanar do torpor e de evidenciar a realidade sem anestesia. A Patrícia tem esse dom. Sou fa dos seus posts. Ela teve a gentileza de me deixar reproduzi-lo no meu blogue, no entanto, aconselho a todos uma leitura atenta a tudo quanto ela escreve.
Da Alemanha, com amor
Lilith

"Ilusoes carnais
Encontro-me com o meu ser. Desacordada nesta cama. Foste mais do que memória nos corpos de outros. Nao eras tu. Nao era ninguém. Ninguém que me ficasse na memória. Só tu. Quem eu procurei noutros sorrisos, noutros seres. Fiquei, sorri. Entreguei-me aos prazeres da carne. Fingi que te tinha. Mas nao tinha. Nao eras tu. Nem sequer uma imitacao de ti. Mas fechei os olhos e vi-te. Talvez até te tenha sentido. Em muitas alturas, estiveste comigo. Até ao despertar. Até voltar a olhar o escuro. Este escuro em que a minha alma se tornou. É quando esta luz sombria me envolve, que a solidao me dói mais. Porque percebo que me enganei de novo. Que me afundei mais ainda nesta escuridao. Nao eras tu. Nunca mais serás tu, aqui ao meu lado, no meu corpo. Apenas permaneces em mim, em memória que teima em nao desaparecer. E eu, que te tenho aqui, percebo que a cada imitacao tua que encontro me sinto mais só, mais longe de te ter. A ilusao dos corpos. O pesadelo logo a seguir. Agora, apenas quero deixar-me dormir. Deixar o meu corpo repousar deste sexo fingido que nao me cala a dor. Deixar-me dormir e quem sabe, sonhar contigo. Uma vez mais"

(in "O corpo dos outros" - abrotea http://abrotea.blogspot.com)

P.S. - desculpem este post nao ter a acentuacao correcta - o teclado nao permite - tambem estou impossibilitada de colocar os links que habitualmente o blogspot permite para redireccionamento de página, daí ter escrito no post os enderecos dos blogues mencionados.